(Folhapress) O prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) confirmaram na tarde desta sexta-feira (21) que o coronel da reserva Ricardo Mello Araújo (PL) ocupará a vice na chapa do emedebista em busca da reeleição na cidade de São Paulo. O anúncio coube ao governador.
O ex-Rota foi indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que se manteve irredutível a respeito da escolha, apesar da insatisfação no entorno do prefeito. Tarcísio, que antes defendia a autonomia de Nunes, passou a endossar o padrinho político e tomar as rédeas da definição.
O prefeito disse que ficou muito satisfeito com a união em torno da indicação e que considera Mello Araújo uma boa opção. Ele disse que inicialmente muitos não tinham simpatia pelo nome apresentado por Bolsonaro, mas que a convergência foi sendo construída à medida que os aliados foram o conhecendo.
Nunes afirmou também que começa a pré-campanha dando um exemplo de atitude democrática com as negociações para a escolha da vice. “Todo mundo fala ‘Você tem que falar que você que escolheu, que você é o bambambam’. Eu discuti conjuntamente e recebo de forma muito positiva uma construção de 11 partidos”, disse.
O prefeito sinalizou discordância com a análise de que ele terceirizou a escolha para o posto. “Nesse processo chegou até a aparecer algum nome que eu falei: ‘Esse eu não topo’.”
Nunes disse que todos os nomes têm prós e contras e afirmou que Mello Araújo é “corajoso e determinado” e “não aceita questões de corrupção e crime organizado”. Ele disse que começarão a trabalhar juntos e que convidará o vice para colaborar no plano de governo.
Questionado sobre preocupações a respeito da imagem de radicalidade que o ex-Rota pode levar para a chapa, ele respondeu: “Se for para ser radical contra quem faz exploração sexual infantil, para combater corrupção, contra o crime organizado, é o cara que eu quero”.
Já Tarcísio elogiou a gestão de Mello Araújo à frente da Ceagesp e disse que o coronel da reserva agrega valor à chapa. “A gente está muito confortável com isso, tenho certeza que é uma grande aquisição. É uma pessoa que tem identidade com um tema muito caro para a cidade de São Paulo hoje, que é o tema da segurança pública.”
Antecipado nesta quinta pela coluna Mônica Bergamo, da Folha, o anúncio ocorreu em evento na zona sul de São Paulo para assinatura de aditivo que prevê a extensão da Linha 5 do metrô. O presidente da Câmara Municipal, Milton Leite (União Brasil), também esteve presente. Entre as maiores legendas da coligação de Nunes, a União Brasil foi a que mais demorou a aceitar Mello Araújo na vice.
A direção municipal do PL divulgou nota afirmando que o partido e a União fecharam um acordo. Segundo o texto, o PL municipal apoiará a União na eleição para a mesa diretora da Câmara Municipal em 2025. “Essa união é feita para somar forças com o objetivo de reeleger o prefeito Ricardo Nunes.”
Mais cedo nesta sexta-feira (21), Nunes afirmou que ficou acordado no jantar que Tarcísio seria o responsável por indicar o nome. O prefeito disse que quer falar sobre inaugurações, e não sobre a vice, e que o governador sugeriu fazer logo o anúncio para virar a página.
Tarcísio viaja para Nova York neste fim de semana, onde apresentará o leilão da Sabesp a investidores, e volta apenas no dia 3 de julho.
O anúncio acontece dois dias após jantar organizado pelo governador no Palácio dos Bandeirantes com dirigentes nacionais dos partidos que compõem a coligação do prefeito.
O nome de Mello Araújo foi levado a Nunes no início do ano por Valdemar Costa Neto, presidente do PL, mas ganhou força apenas após a entrada do coach Pablo Marçal (PRTB) na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Até então, o prefeito se mantinha como o único candidato associado ao campo da direita.
Com Marçal alinhado a valores ideológicos defendidos pelo bolsonarismo e bem posicionado nas pesquisas (ele marcou entre 9% e 7% em cenários testados pelo Datafolha ao fim de maio), o apoio de Bolsonaro a Nunes ficou mais caro.
A entrada do empresário na corrida eleitoral surpreendeu a pré-campanha do prefeito, que tinha a expectativa de definir o nome do vice apenas no período das convenções partidárias, ao fim de julho.
Nunes avalia que Mello Araújo é um nome radical, que pode afastar os eleitores moderados –o presidente Lula (PT) obteve 53% dos votos na capital no segundo turno de 2022.
Para não perder o endosso do PL, cujos deputados mostraram animação com o coach, o prefeito precisou oferecer o posto ao partido.
Bolsonaro não quis falar em outra indicação e costuma se referir positivamente à gestão do ex-Rota à frente da Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo). Aliados dizem que não houve um nome forte que pudesse convencer o ex-presidente a deixar de lado Mello Araújo.
Com o surgimento de Marçal, Tarcísio, que é o principal cabo eleitoral do prefeito e tem interesse em sua reeleição, manifestou preocupação a aliados e disse que era preciso estancar a ascensão do empresário.
O governador, que antes dizia que a decisão caberia a Nunes, passou a defender publicamente o nome de Mello Araújo e cobrou agilidade na escolha. Ele avaliava que a indicação era necessária para sacramentar a aliança com Bolsonaro.
Pressionado pelo entorno do ex-presidente, que o acusava de tentar trair o padrinho político de olho na Presidência em 2026, Tarcísio então pressionou Nunes. O endosso a Mello Araújo é também um aceno do governador ao bolsonarismo –seu nome não era da preferência de Tarcísio.
O governador está engajado em evitar a vitória de Guilherme Boulos (PSOL), principal adversário de Nunes. Seu entorno diz que a eleição do deputado federal atrapalharia ações em conjunto com a prefeitura e que é importante que a relação com a administração municipal esteja pacificada.
Figuras da política estadual também afirmam que o governador quer na prefeitura alguém sob sua influência –nesse sentido, tanto Boulos quanto Marçal caminhariam com independência.
Depois das manifestações de Tarcísio, a pré-campanha de Nunes reconheceu que não era mais possível adiar a decisão sobre a vice.
No jantar organizado pelo governador com líderes partidários da coligação de Nunes, Tarcísio foi o primeiro a falar sobre a vice com jornalistas que aguardavam o fim do evento. Nunes ficou ao lado e, somente após questionamento, fez um breve pronunciamento ecoando as palavras do aliado.
O clima no entorno do prefeito é de velório diante da indicação de Mello Araújo, visto como alguém que trará mais ônus do que bônus à campanha pela reeleição. A insatisfação é geral e há reações muito negativas ao nome do ex-Rota.
Aliados se preocupam não apenas com a radicalidade que Mello Araújo pode imprimir à chapa. Outro receio é que a escolha leve o eleitor a associar a pauta da segurança pública a uma responsabilidade do prefeito, e não do governador. Como mostrou o Datafolha, para 23% dos paulistanos, o maior problema da cidade é a segurança. Nunes quer evitar ser fustigado com base no tema.
Nesta sexta-feira (21), ao anunciar o vice, Nunes disse que a segurança não é papel exclusivo da prefeitura, mas que, pelo seu tamanho, tem ações específicas voltadas para o tema. “Não vai ser o vice prefeito que vai atuar em questão de segurança, mas pode colaborar comigo em vários quesitos”, afirmou.
Integrantes de partidos da coligação também citam um grande receio sobre o impacto da presença do coronel da reserva na periferia. Aliados se preocupam, inclusive, se o crime organizado permitirá que Mello Araújo faça campanha em certos locais dominados pelo tráfico.
Para criticar a chapa, a oposição usará uma declaração de Mello Araújo na qual defendeu a diferença de tratamento em abordagens policiais nos Jardins (área nobre de São Paulo) e na periferia.
“É uma outra realidade. São pessoas diferentes que transitam por lá. A forma dele abordar tem que ser diferente. Se ele [policial] for abordar uma pessoa [na periferia], da mesma forma que ele for abordar uma pessoa aqui nos Jardins [região nobre de São Paulo], ele vai ter dificuldade. Ele não vai ser respeitado”, disse o ex-Rota ao UOL em 2017.
As campanhas de Boulos e Tabata Amaral (PSB) comemoraram a escolha de Mello Araújo. Eles avaliam que a indicação amarra Nunes a Bolsonaro e ameaça os votos do prefeito entre os eleitores moderados.
“Se o prefeito Ricardo Nunes resistiu ao nome do Ricardo Mello Araújo, é porque não o queria como seu vice. Se foi forçado a aceitá-lo é porque quem manda na sua candidatura é o Bolsonaro. Assim ele escancara sua fraqueza e deixa São Paulo de joelhos para outros interesses, não os da cidade”, afirmou Tabata.
Já a pré-campanha do prefeito tentará explorar o apelo da gestão do coronel da reserva à frente da Ceagesp, defendendo que ele lançou mão de ações de combate à corrupção crônica no local. Não deve ser mencionada sua atuação como chefe da Rota, batalhão de elite da PM conhecido pela alta letalidade em suas ações.
Para aliados, o oficial da reserva da Polícia Militar foi o responsável por colocar ordem no centro de distribuição durante o governo Bolsonaro. Por outro lado, sua gestão é acusada por sindicalistas de militarizar o espaço e promover abusos.
OS CAPÍTULOS DA DEFINIÇÃO DO VICE DE NUNES
Valdemar X Tarcísio
Em 29 de janeiro, Valdemar da Costa Neto, presidente do PL, indica lista com sugestão de nomes para vice, que inclui o coronel da reserva Mello Araújo, a escolha de Jair Bolsonaro. No mesmo dia, Tarcísio de Freitas reage ao afirmar que o vice é uma escolha pessoal do prefeito e que não cabe a ele ou a ninguém indicar o cargo
Fator Marçal
Em 29 de maio, Datafolha mostra Pablo Marçal entre 7% e 9%, a depender do cenário pesquisado, em um bloco intermediário da disputa. A competitividade do nome dele gera ameaça de atração de bolsonaristas
Marçal com Bolsonaro
Em 4 de junho, Marçal se encontra com Bolsonaro. Depois, afirma ao jornal O Estado de S. Paulo que não havia chances de Bolsonaro apoiar Nunes e que a candidatura do prefeito estava desidratando. No dia seguinte, Bolsonaro diz ter compromisso com Nunes, por meio da indicação de Mello Araújo para a vice
Tarcísio cobra indicação rápida
Em 10 de junho, Tarcísio afirma que, pela mudança de cenário, seria importante que Nunes fizesse o acerto da vice o mais rápido possível
Almoço e jantar
Em 14 de junho, Nunes almoça com Tarcísio, Bolsonaro e Mello Araújo na prefeitura. Ali, diz que falta aparar as arestas com partidos para a indicação do policial. É marcado um jantar para 19 de junho, organizado por Tarcísio, com Nunes e membros dos partidos, para selar o nome do oficial no posto. No entanto, confirma-se apenas que o PL indicará a vaga.