De acordo com o jornal Estadão, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está prestes a implementar uma nova portaria que traz regras mais rígidas para o uso da força pelas polícias militar e civil de todo o país, além das guardas municipais. As novas diretrizes determinam que armas de fogo só poderão ser utilizadas como “último recurso”, estabelecem critérios mais rígidos para abordagens e revistas, e exigem justificativas por escrito para o uso excepcional de algemas.
Essas medidas fazem parte de um esforço para reduzir a letalidade policial no Brasil e atualizar a Portaria Interministerial 4.226, de 2010. A proposta, que reúne leis, recomendações, decretos e decisões judiciais anteriormente dispersos, foi desenvolvida por um grupo de trabalho coordenado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública, com participação de representantes de várias pastas e entidades.
Uma das mudanças mais significativas é a possibilidade de os estados que não aderirem às novas diretrizes deixarem de receber verbas do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP), que financia a compra de equipamentos especiais para ações policiais. Antes, o governo apenas “considerava” a adesão às diretrizes como critério para repasses; agora, a adesão será obrigatória para obter os recursos.
Entre as novidades, as novas regras preveem que o uso de armas de fogo será permitido apenas em situações de legítima defesa ou risco iminente de morte, endurecendo as condições para disparos. A gravação de operações policiais também será obrigatória, sempre que possível, e todos os procedimentos e decisões deverão ser documentados.
Para abordagens e revistas, os policiais deverão informar claramente o motivo da ação e registrar os dados do cidadão abordado, justificando a “fundada suspeita”. Em casos de buscas domiciliares sem mandado judicial, o consentimento do morador deverá ser solicitado e devidamente registrado.
Já o uso de algemas será restrito a situações em que houver resistência à prisão, risco de fuga ou ameaça à integridade física de alguém, e a aplicação dessa medida deverá ser justificada por escrito.
As novas diretrizes têm gerado reações mistas. O presidente do Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública (Consesp), Sandro Avelar, afirmou que o colegiado só adotará uma posição formal após sua próxima reunião em outubro, apontando que existem diferentes perspectivas entre os estados sobre a atuação policial.
Por outro lado, a “bancada da bala” criticou duramente a proposta. O deputado Alberto Fraga (PL-DF) classificou as novas regras como um “desserviço”, afirmando que as restrições dificultam o trabalho policial. “O governo quer agir como se o Brasil fosse um país sem violência”, declarou.
Em contrapartida, o presidente da Associação Nacional dos Guardas Municipais do Brasil, Reinaldo Monteiro, elogiou as mudanças, destacando que elas trarão mais segurança para os policiais e para a população. “É fundamental que a sociedade saiba como e quando a força pode ser usada”, afirmou, reforçando que a ideia central é garantir uma norma clara e objetiva, que respeite os direitos humanos e reduza o uso excessivo da força.
A discussão sobre o uso da força pelas forças de segurança ocorre em um contexto de crescente letalidade policial. Em 2023, o Brasil registrou 6.393 mortes por intervenção policial, uma média de 17 por dia, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Nos últimos cinco anos, as polícias do país mataram mais de 6 mil pessoas anualmente.