Há uma semana, desde que o personal trainer Eduardo Alves de Sousa, de 31 anos, espancou um morador de rua de 48 anos, após flagrá-lo tendo relações sexuais com sua esposa, a comerciante Sandra Mara Fernandes, de 33 anos, o bairro de Jardim Roriz, em Planaltina (DF), não fala sobre outra coisa.
A Polícia Civil investiga o caso sob sigilo, segundo comunicado enviado pelo delegado Diogo Cavalcante, por se tratar de um tema sensível, enquanto muito se especula sobre o que teria de fato acontecido: traição ou mesmo um estupro. O casal também deletou seus perfis nas redes sociais, o que aumentou ainda mais o mistério.
Na noite em que tudo aconteceu, por volta das 22h do dia 9 de março, foi registrado um boletim de ocorrência na 16ª DP, mas nenhum dos envolvidos encaminhados pela Polícia Militar foi preso em flagrante, seja por agressão — observada por testemunhas e câmeras de segurança da rua, na Quadra 63 — ou por abuso.
Nas imagens, é possível ver que a mulher, em choque, não reage e assiste tudo do chão. Aos PMs que atenderam a ocorrência, ela negou que havia sido forçada pelo homem, e em seguida foi encaminhada a um hospital pelo marido, que, à polícia, disse acreditar que ela não estava em plenas condições psicológicas, situação da qual, para ele, o morador de rua teria tirado proveito. O personal afirmou que ela já vinha apresentando problemas psicológicos.
Fato é que, momentos antes de ser encontrada dentro do próprio carro com o pedinte ainda não identificado, Sandra participava, ao lado da sogra, de uma ação de caridade promovida pela igreja evangélica que elas frequentam. Em alguns registros feitos, a esposa do personal trainer aparece entregando uma Bíblia ao mesmo homem, que em seguida se ajoelha aos seus pés. Uma interação maior entre os dois teria acontecido em seguida, pouco antes de nora e sogra se separarem, segundo a própria vendedora narra. Como ela demorou a dar notícias, horas depois Eduardo saiu pelas ruas em busca da esposa na área onde mais cedo ela havia ido com a mãe. Foi quando encontrou o carro estacionado.
Nos últimos dias, foi vazado um trecho de um depoimento dado por Sandra sobre o que aconteceu naquela noite. O teor do áudio, confirmado em reportagem do portal Metropoles, também foi obtido pelo GLOBO.
Em certo momento, a mulher afirma que enxergou o morador de rua como Eduardo (o marido) e ainda como Deus e que aquilo a deixou com o coração apertado.
“Às vezes eu enxergava ele como Deus e as vezes eu enxergava ele como o Eduardo”, diz a mulher na gravação.
Durante o depoimento, ela afirma ainda que sentiu que aquele era seu propósito e conta que disse à própria sogra para deixá-la “receber seu propósito”. Ela narra ainda que chegou a beijar o morador de rua na frente da mãe de Eduardo, que a repreendeu, mesmo após o homem, ainda segundo ela, ter feito um gesto de balançar as partes íntimas na frente delas e de sua filha pequena, que ela diz que estava no local. Em seguida, dentro do carro, o homem teria proposto de encontrá-la na rodoviária do bairro para que eles “ficassem juntos”, e ela disse que “olhando para ele”, confirmou que iria.
A reportagem tentou contato com os envolvidos, mas não obteve retorno. No início da semana, Eduardo, sem dar maiores detalhes, divulgou um vídeo onde afirma que a esposa se encontra sob cuidados médicos num hospital público e reforça que ela foi vítima de violência sexual.
“Estão gerando um conteúdo ofensivo contra a honra da minha esposa, que sofreu violência sexual aqui na cidade de Planaltina (DF) por um morador de rua, e diante disso vejo que os fatos têm sido transmitidos de maneira errônea por ambas as partes, sendo que no momento deveriam estar preocupados com a saúde dela, já que a mesma se encontra internada”, diz o personal na gravação, que acrescenta que a família toda tem sofrido com a repercussão de tudo o que aconteceu.
‘Pimenta e pimentinha’
Após o caso viralizar na internet, Eduardo e Sandra se desfizeram das redes sociais. Ele é personal trainer numa grande rede de academias de Brasília, enquanto Sandra, conforme é possível observar num de seus últimos registros na rede, trabalha como revendedora de roupas femininas, masculinas e infantis numa loja batizada por ela de “Pimenta e Pimentinha”, atividade onde também conta o apoio do marido. A página do comércio no Instagram, onde era possível ver fotos dos dois como modelos das roupas, foi apagada. Mas um perfil um pouco mais esquecido no Facebook continua no ar.
Comissão de Direitos Humanos da CLDF acompanha o caso
Ao GLOBO, o secretário da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), Gabriel Elias, afirmou que o parlamento acompanha o desenrolar das investigações acerca do caso, assim como a situação do morador de rua que, para ele, se torna ainda mais vulnerável nas ruas com a repercussão do caso. A CDH já solicitou informações à Polícia Civil sobre a ocorrência do último dia 10.
— Na situação de vulnerabilidade que a vítima se encontra, há o risco dele sofrer outras violências, dada a ampla exposição do caso — afirmou Elias.
Por enquanto, a Defensoria Pública do DF ainda não foi acionada para representar o homem de 48 anos durante o inquérito. Questionada se houve acolhimento ao homem agredido, a Secretaria de Desenvolvimento Social do DF disse que não pode repassar informações pois o caso encontra-se sob sigilo.