Embora a inflação oficial medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) tenha registrado uma queda de 0,68% em julho, os brasileiros que mantêm algum dinheiro depositado na caderneta de poupança não têm motivos para comemorar.
Levantamento da plataforma de dados financeiros TC/Economatica indica que, na janela dos últimos 12 meses encerrada em julho, a rentabilidade real da poupança, ou seja, descontada pela variação da inflação, ficou negativa em 3,52%.
Os dados do levantamento mostram que a última vez em que a poupança apresentou uma rentabilidade positiva no acumulado de 12 meses foi em agosto de 2020, há quase dois anos, portanto, quando o rendimento real ficou em 0,45% no intervalo de um ano.
“A alocação em poupança não faz nenhum sentido neste momento. O rendimento real negativo, somado ao fato de que a rentabilidade depende do aniversário mensal para ser pago, torna essa aplicação muito arcaica, desatualizada e ultrapassada”, diz Bruno Mori, economista e planejador financeiro com a certificação CFP.
Ele acrescenta que aqueles que deixam o dinheiro aplicado na poupança têm um viés comportamental de familiaridade muito enraizado.
Professora de Economia da ESPM e planejadora financeira CFP, Paula Sauer diz ainda que, apesar da vasta gama de produtos de renda fixa ofertado atualmente no Brasil, a caderneta de poupança continua sendo a “queridinha” da maior parte dos brasileiros que inicia sua jornada em investimentos.
Os dados mais recentes do BC (Banco Central) mostram que cerca de 164 milhões de pessoas mantinham algum valor depositado na poupança ao final de 2019.
“O cliente que deixou de consumir para poupar viu o poder de compra de seu dinheiro diminuir. Isso é muito frustrante e desestimula muitos a guardar dinheiro”, diz a especialista.
Ainda de acordo com os dados da TC/Economatica, quem aportou R$ 1.000 na poupança há 12 meses, teria R$ 1.061,97 no final de julho. No entanto, descontada pela inflação de 10,07% no período, o retorno final correspondente seria de R$ 964,82.
“Imagina você deixar de consumir, se disciplinar em guardar dinheiro, e quando realizar seu resgate, poder comprar menos que antes”, assinala a professora da ESPM.
Poupança rende menos da metade da Selic
Estudo elaborado pela Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças) mostra que, com a nova alta na taxa Selic realizada pelo BC (Banco Central) na última quarta-feira (3), para 13,75% ao ano, enquanto as principais alternativas na renda fixa passam a oferecer rendimentos mais atraentes, a poupança tem o pior retorno entre as opções analisadas, mesmo isenta do IR (Imposto de Renda).
A despeito da escalada da Selic, que saiu da mínima histórica de 2% em março de 2021 para os atuais 13,75% ao ano, a aplicação da caderneta segue com o rendimento inalterado em 6,17% ao ano, mais a TR (Taxa Referencial).
A remuneração da poupança é de 0,5% ao mês sempre que a Selic estiver acima de 8,5% ao ano. Já quando a taxa básica é de até 8,5%, o rendimento da poupança equivale a 70% da Selic.
“Nesse cenário, a poupança, apesar de ser uma aplicação fácil e segura, não fica competitiva, rendendo menos da metade da Selic”, disse Andrew Storfer, diretor de economia da Anefac.
A inflação em níveis ainda pressionados, somada às condições financeiras mais restritivas impostas pelo avanço da Selic, tem contribuído para saques cada vez maiores da poupança.
No primeiro semestre deste ano, as retiradas em cadernetas de poupança superaram os depósitos em R$ 50,5 bilhões, segundo dados divulgados pelo BC.
Nos seis primeiros meses do ano, as saídas de recursos na modalidade somaram R$ 1,808 trilhão, enquanto os depósitos totalizaram R$ 1,758 trilhão.
Esse é o maior volume de resgate para o período na série histórica, iniciada em janeiro de 1995. O recorde negativo anterior era do primeiro semestre de 2016, quando houve saque líquido de R$ 42,61 bilhões.
O fluxo de recursos na poupança passou a acumular retiradas significativas em 2021, quando o poder de compra do brasileiro caiu significativamente diante de uma inflação de dois dígitos e um intenso choque de juros.
Quanto rendem R$ 1.000 com a Selic a 13,75% ao ano
Os valores mostram o resultado líquido após o desconto do Imposto de Renda (se houver), sem considerar a inflação, em R$
Tipo de investimento – Juros ao ano (em %) – 6 meses de aplicação – 12 meses de aplicação – 18 meses de aplicação
CDB (bancos médios)* – 15,13 – 1.058,37 – 1.124,78 – 1.194,08
CDB (grandes bancos)* – 12,79 – 1.049,61 – 1.105,5 – 1.163,2
Fundo de investimento conservador – DI* – 13,75 – 1.053,23 – 1.113,44 – 1.175,88
LCA/LCI – 12,38 – 1.060,07 – 1.123,75 – 1.191,25
Poupança – 6,17 – 1.030,39 – 1.061,7 – 1.093,96
Tesouro Selic* – 13,89 – 1.053,74 – 1.114,57 – 1.177,69
*Investimentos com incidência de IR sobre o rendimento. As alíquotas variam conforme o período da aplicação, sendo de 15% (36 meses), 17,5% (12 e 18 meses) e 20% (6 meses) | Fonte: Anefac.