O presidente Jair Bolsonaro (PL) conseguiu, com apoio do Congresso e driblando regras de controle de gastos, incluir 5,7 milhões de novas famílias no Auxílio Brasil desde novembro de 2021. A expansão beneficiou principalmente estados onde o presidente foi derrotado por Fernando Haddad (PT) em 2018 e agora tenta melhorar sua imagem de olho na reeleição.
Em 14 unidades da federação, a ampliação do número de beneficiários do programa foi superior à expansão média do país quando se considera o total da população de cada estado.
A lista inclui os nove da região Nordeste, além de Pará, Amapá, Acre, Amazonas e Rio de Janeiro. Bolsonaro perdeu para Haddad em dez desses estados em 2018 –todo o Nordeste e o Pará.
Com o Auxílio Brasil, o governo ampliou de 14,5 milhões para 20,2 milhões as famílias atendidas pela política de transferência de renda. Essa expansão de 5,7 milhões de beneficiários representa 2,7% da população do Brasil, estimada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
No entanto, essa taxa foi mais alta, por exemplo, no Piauí, Pernambuco e Sergipe, onde chegou a 4,6% da população estadual. No Amapá, o índice ficou em 4,5%.
Maranhão e Alagoas, que apresentam altas taxas de pobreza, tiveram um aumento de beneficiários que representa 3,2% da população. Na Bahia, estado mais populoso do Nordeste, o índice foi de 4,2%.
Já estados bolsonaristas como Roraima e Rondônia, embora estejam entre os mais pobres do país, não registraram aumento expressivo no número de famílias atendidas pelo novo programa. A taxa de ampliação foi de 1,9% e 1,8%, respectivamente.
Segundo o Mapa da Pobreza, elaborado pelo FGV Social, esses estados apresentaram, em 2021, um patamar de miséria acima da média do país.
Tocantins foi o único palco de derrota de Bolsonaro na última eleição e que ficou entre os menos beneficiados com a expansão do Auxílio Brasil desde o lançamento do programa, em novembro do ano passado.
O Palácio do Planalto e o núcleo da campanha de Bolsonaro à reeleição tinham como objetivo turbinar o programa de transferência de renda para elevar a popularidade do presidente entre os eleitores de baixa renda, especialmente no Nordeste.
Apesar de o Auxílio Brasil ter alcançado um recorde no número de famílias (20,2 milhões), a cobertura ainda está distante do desempenho do auxílio emergencial, que foi criado em abril de 2020 para atender a população mais vulnerável com a chegada do coronavírus no pais.
O benefício atingiu quase 40 milhões de residências. Com isso, o governo fez uma forte ampliação do gasto social, e Bolsonaro viu sua popularidade subir –a partir do quarto mês de pagamento.
Para suavizar o impacto negativo do fim do auxílio na popularidade do presidente, o governo apostou no Auxílio Brasil e para isso patrocinou duas PEC (propostas de emenda à Constituição) para escapar de limitações orçamentárias e aumentar a verba para o programa.
Com isso, além de ampliar o número de beneficiários, foi possível subir o valor médio do benefício social de aproximadamente R$ 230 para R$ 607 por mês.
Técnicos do Ministério da Cidadania, responsável pela gestão do programa de transferência de renda, afirmam que o sistema para inclusão de famílias no Auxílio Brasil funciona de forma automatizada e não faz qualquer distinção ou preferência por região.
Além disso, ressaltam, os recursos alocados no programa neste ano foram suficientes para zerar a fila de espera, ou seja, foram atendidas todas as pessoas que tinham pedido o benefício e cuja documentação já havia sido aprovada pelo ministério.
Na avaliação do diretor do FGV Social, Marcelo Neri, a diferença da ampliação média do Auxílio Brasil entre os estados pode se explicar por questões de operacionalização do programa. Rondônia e Roraima, por exemplo, têm zonas mais remotas e de difícil acesso.
Ele cita ainda a redução da verba para a operar a rede de assistência social, que inclui centros de atendimento à população.
“É arriscada a estratégia de usar o meio digital como forma de acesso a um programa de combate à pobreza. Mas também é um desafio fazer isso de forma analógica. Não há uma solução simples”, disse Neri.
Ao turbinar o Auxílio Brasil, o Planalto espera melhorar o desempenho eleitoral de Bolsonaro na região onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem mais força política.
O petista tem 56% das intenções de votos no primeiro turno entre pessoas que recebem o Auxílio Brasil ou moram com alguém que é beneficiário do programa, segundo pesquisa Datafolha. Bolsonaro tem 28% entre esses eleitores.
No fim de maio, o presidente tinha 20%, contra 59% de intenção de votos para Lula.
Bolsonaro, portanto, tem conseguido avançar na popularidade nesse segmento, mas ainda está longe do patamar alcançado pelo petista.
A campanha bolsonarista acredita que o efeito eleitoral da ampliação do Auxílio Brasil, que passou para R$ 600 em agosto, só deve ficar mais evidente em setembro –com auge previsto para o período entre o primeiro e o segundo turno.
“Neste momento, não conseguimos ainda reparar um efeito disso no público que recebe o Auxílio [Brasil]. A inflação corroeu muito a capacidade das pessoas poderem acessar bens. A deflação das últimas semanas atingiu principalmente os combustíveis; os alimentos continuam em patamar elevado”, disse Leonardo Paz Neves, analista no Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da FGV.
De acordo com o calendário do Auxílio Brasil, a primeira parcela do benefício ampliado para R$ 600 será liberada de 9 a 22 de agosto. Ou seja, nem todas as famílias receberam o novo valor até a pesquisa Datafolha mais recente.
Além de ampliar o valor da transferência de renda, Bolsonaro extinguiu o nome Bolsa Família –associado aos governos petista. A estratégia foi criar uma marca para o presidente na área social.
No primeiro ano de governo, Bolsonaro não deu prioridade ao Bolsa Família, que chegou a ter uma fila de espera de quase 1,5 milhão de famílias.
A campanha do presidente à reeleição não tem esperança de conseguir reverter o cenário de favoritismo de Lula na região, mas espera melhorar o desempenho de Bolsonaro nesses estados.