Carol Solberg, atleta do vôlei de praia, recebeu uma advertência pela frase “Fora Bolsonaro”, nesta terça-feira, em julgamento no Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Voleibol. Ela foi condenada, por três votos a dois, com base no artigo 191 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), por descumprir regulamento, com multa convertida em advertência. Os auditores, porém, deixaram claro que Carol não pode voltar a se manifestar politicamente na quadra de jogo.
Assim, ela poderá jogar a segunda etapa do Circuito Brasileiro, que começa nesta quinta-feira, no CT da entidade, em Saquarema. Foi neste mesmo local, na volta da modalidade, em esquema “bolha”, que a jogadora fez o desabafo, após premiação pelo bronze, em 20 de setembro, em entrevista na quadra de areia.
De acordo com a denúncia, a pena poderia chegar a seis jogos de suspensão mais pagamento de multa no valor de R$ 100 mil (equivaleria a dois anos de prêmios da atleta).
A votação ficou empatada em dois votos a dois e Otacílio Soares de Araújo, presidente do tribunal, foi quem desempatou.
Os dois primeiros auditores absolveram a atleta no artigo 258 (assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras do código), mas a condenaram no 191 (deixar de cumprir o regulamento da competição), com pena de R$ 1.000 e R$ 500, convertidos em advertência. Os outros dois auditores absolveram a atleta em ambos artigos.
Otacílio puniu a atleta nos dois artigos, em que ela foi denunciada, com ambas penas convertidas em advertência, “porque ela se expressou no momento errado e agora tem de assumir as consequências”. Ao GLOBO, ele falou que “manteve a coerência de outros julgamentos de outras modalidades e que espera que ela (Carol) tenha aprendido a lição”.
Assim, ela foi absolvida no artigo 258 (votação de 4 a 1 a favor da atleta) e condenada no artigo 191, com pena revertida em advertência (com votação de 3 a 2).
Na opinião de Otacílio, a fala de Carol pode “não fazer bem ao esporte”. Disse que ela estava errada ao fazer esta manifestação “dentro das quatro linhas”. Ele falou ainda que, “se amanhã outro atleta falar contra ou a favor disso ou daquilo, não é justo. Ela está lá para falar sobre o que ocorreu dentro de quadra e não sobre a política brasileira, ou mundial”.
Lembrou que foi proibido aos atletas do futebol mostrar a camisa com recados de “alô papai”, “alô mamãe” e que ela pode usar as redes sociais para falar sobre política. “Foi um puxão de orelha, uma advertência. Se ela repetir, pode ser punida de uma forma pior”.
No seu entendimento, Carol descumpriu o artigo 3.3 de um anexo do regulamento do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia que diz que “o jogador se compromete a não divulgar, através dos meios de comunicações, sua opinião pessoal ou informação que reflita críticas ou possa, direta ou indiretamente, prejudicar ou denegrir a imagem da CBV e/ou os patrocinadores e parceiros comerciais das competições”.
Antes do julgamento, Otacílio já havia comparado a manifestação da Carol a uma hipotética fala, de um atleta do futebol, a favor “do vereador Zé das Couves”, após aplicar cinco gols e dar o número do candidato na saída de campo. Comentou que este não é o local adequado.
Porém, caso semelhante, em 2018, em plena campanha presidencial, os atletas do vôlei Wallace e Maurício, fizeram o número 17 com a mãos, referindo-se a Bolsonaro, na quadra de vôlei, em um Mundial, e não foram a julgamento.
O caso de Carol ganhou repercussão porque além de os colegas Wallace e Maurício não terem tido o mesmo tratamento, a atleta foi ameaçada nas redes sociais por apoiadores de Bolsonaro.
O julgamento
Antes de começar a sessão, Otacílio lembrou que os STJD das confederações não são tribunais de pena e, sim, disciplinares.
Em seu depoimento, Carol disse “estava feliz pela conquista da medalha de bronze e que não conseguiu não pensar no que acontece no Brasil, queimadas no Pantanal, por exemplo” e que sua fala foi “um grito de tristeza e indignação pelo que está acontecendo“. Ela disse, ainda, que elogiou a CBV pela forma como a entidade organizou a competição e que não quis ofender a entidade nem os patrocinadores. Disse também que em nenhuma outra ocasião teve problemas com a CBV e lembrou que desde os 15 anos representa o Brasil em torneios internacionais. Lembrou ainda que não é beneficiária do Bolsa Atleta.
A procuradoria perguntou sobre a repercussão do caso, se ela se estava arrependia. Carol falou que acredita na liberdade de expressão quando dá uma entrevista.
Em sua sustentação, a procuradoria falou que um direito não pode se transformar em abuso, que Carol escolheu lugar errado para se manifestar e que seu caso não deve ser comparado ao de Wallace e Maurício, que fizeram alusão a Bolsonaro em torneio internacional, fora da jurisdição do STJD.
Já a defesa se baseou no fato de que a atleta não infringiu as regras do Código, uma vez que ela não ofendeu nem causou prejuízo a imagem da CBV e dos patrocinadores.
A atleta chegou a dizer que “seria terrível perder um jogo que fosse, em caso de punição”. E lembrou que este ano de pandemia, jogou apenas três torneios mas manteve sua equipe inteira.
Do Agência O Globo | Em: 13/10/2020 às 17:20:56