
Três em cada dez brasileiros adultos são analfabetos funcionais. O dado, divulgado nesta segunda-feira (5) pelo Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), não é apenas alarmante — é uma acusação direta contra a sociedade e as sucessivas gestões públicas que, há décadas, prometem reformas educacionais profundas, mas entregam paliativos, slogans e retrocessos.
Em 2024, 29% da população entre 15 e 64 anos não consegue interpretar frases simples, identificar preços ou realizar operações matemáticas básicas. O número é exatamente o mesmo de 2018. Em seis anos, apesar dos avanços tecnológicos e das transformações sociais, o Brasil não saiu do lugar. Pior: entre os jovens, o analfabetismo funcional cresceu, saltando de 14% para 16%. A pandemia é apontada como fator agravante, mas não explica a raiz do problema: a falência estrutural de um modelo educacional incapaz de formar cidadãos plenos.
O fracasso da educação básica no Brasil se revela em cada camada do levantamento: 27% dos trabalhadores são analfabetos funcionais, e até mesmo entre os brasileiros com diploma universitário, 12% não dominam plenamente leitura e escrita. Em um país que se pretende emergente, a incapacidade de garantir alfabetização funcional adequada compromete qualquer projeto de crescimento econômico, inovação ou combate à desigualdade.
A desigualdade racial acentua o quadro: entre negros, indígenas e amarelos, os índices de analfabetismo funcional são ainda mais elevados, denunciando que a exclusão educacional é seletiva, reforçando ciclos históricos de marginalização.
Mas o que os números mais deixam claro é a ausência de vontade política real. A educação, frequentemente usada como bandeira de campanhas eleitorais, desaparece das prioridades orçamentárias assim que terminam as eleições. Investimentos são feitos de maneira fragmentada, programas são descontinuados a cada troca de governo, e a formação de professores permanece subvalorizada e precarizada. Tecnologias chegam sem planejamento pedagógico, escolas são construídas sem garantir condições mínimas de aprendizado.
O analfabetismo funcional no Brasil não é apenas uma falha: é uma escolha tácita, reforçada ano após ano por políticas públicas insuficientes, pela leniência de gestores e pela indiferença da elite política e econômica que não vê, entre os analfabetos funcionais, seus próprios filhos.
Recuperar essa geração exige muito mais do que slogans ou distribuição de tablets. Exige um compromisso inédito com a alfabetização desde a primeira infância, formação contínua de professores, currículos centrados em competências reais de leitura, escrita e raciocínio lógico — e a coragem de enfrentar desigualdades profundas.
Enquanto o analfabetismo funcional persistir, o Brasil continuará condenado a ser uma sociedade desigual, estagnada e eternamente refém da promessa de um futuro que nunca chega.
